Não é só para inglês ver

“Assumir a importância do domínio efetivo de línguas estrangeiras é fundamental para que o Brasil assuma de vez os desafios linguísticos inerentes a nações que pretendem ampliar sua participação mundial.”

Atuação global

O Brasil está sempre diante de oportunidades de desenvolvimento que exigem a superação de desafios óbvios, como a infraestrutura deficiente e a burocracia excessiva, mas atuar globalmente também demanda mudanças de atitude. Para se tornar um world player, faz-se premente que o país assuma de vez os desafios linguísticos inerentes a nações que pretendem ampliar sua participação mundial.

Línguas de interação

O inglês é inquestionavelmente a língua franca da comunicação internacional e continuará a sê-lo por muito tempo. O Conselho Britânico estima que, no mundo, existam cerca de um bilhão de pessoas estudando inglês e que o número de falantes não nativos já tenha superado o de falantes nativos. Contudo, a importância de um idioma não pode ser mensurada apenas pelo número de pessoas que o utilizam, mas também pelas finalidades para as quais é empregado. 

Sobrevivência

Um ponto crucial diz respeito ao nível dos falantes brasileiros de línguas estrangeiras: um grande percentual deles não vai além do nível de ‘sobrevivência’, mesmo em setores cruciais. Muitas empresas brasileiras ainda não possuem uma cultura de exportação, e o domínio de línguas estrangeiras é apontado como um fator limitador, que afeta o entendimento e a qualidade do atendimento a solicitações vindas de fora

E o “jeitinho”?

No conto “O homem que sabia javanês”, de Lima Barreto, o personagem Castelo subiu diversos degraus na escala social graças ao seu suposto domínio de uma língua estrangeira incomum. Seu oportunismo circunstancial foi suficiente para mantê-lo distante de eventuais comprovações de suas reais habilidades – no caso, inexistentes. Assim como neste conto ambientado no início do século 19, muitos profissionais hoje em dia procuram encobrir suas limitações linguísticas ao escrever “inglês fluente” ou “espanhol avançado” em seus currículos, torcendo para não serem avaliados ou para não precisarem apresentar um certificado de proficiência.

Não há mais espaço para o ‘mais ou menos’ e o ‘na hora eu me viro’. É fundamental reconhecer a importância do domínio efetivo de uma língua estrangeira, para que a barreira comunicativa não contribua para exacerbar preconceitos linguísticos e levar um lado a não enxergar no outro um interlocutor que valha a pena ser ouvido.

  • Hélcio de Pádua Lanzoni é doutor em Linguística Aplicada pelo Instituto de Estudos da Linguagem (IEL – Unicamp) e CEO da TESE Prime.